As Estações (Olavo Bilac)
O inverno
Coro das quatro estações:
Cantemos, irmãs, dancemos!
Espantemos a tristeza!
E dançando, celebremos
A glória da natureza!
O inverno:
Sou a estação do frio;
O céu está sombrio,
E o sol não tem calor.
Que vento nos caminhos!
Trago a tristeza aos ninhos,
E trago a morte à flor.
Há névoa no horizonte,
No campo e sobre o monte,
No vale e sobre o mar.
Os pássaros se encolhem,
Os velhos se recolhem
À casa a tiritar.
Porém fora a tristeza!
Em breve a natureza
Dá flores ao jardim:
Abramos a janela!
Outra estação mais bela
Já vem depois de mim.
Coro das quatro estações:
Cantemos, irmãs, dancemos!
Espantemos a tristeza!
E dançando, celebremos
A glória da natureza!
A primavera
Coro das quatro estações:
Cantemos! Fora a tristeza!
Saudemos a luz do dia:
Saudemos a natureza!
Já nos voltou a alegria!
A primavera:
Eu sou a primavera!
Está limpa a atmosfera,
E o sol brilha sem véu!
Todos os passarinhos
Já saem dos seus ninhos,
Voando pelo céu.
Há risos na cascata,
Nos lagos e na mata,
Na serra e no vergel
Andam os beija-flores
Pousando sobre as flores,
Sugando-lhes o mel.
Dou vida aos verdes ramos,
Dou voz aos gaturamos
E paz aos corações;
Cubro as paredes de hera;
Eu sou a primavera,
A flor das estações!
Coro das quatro estações;
Cantemos! Fora a tristeza!
Saudemos a luz do dia:
Saudemos a natureza!
Já nos voltou a alegria!
O verão
Coro das quatro estações:
Que calor, irmãs! Cantemos
Como ardem as ribanceiras
Cantemos, irmãs, dancemos,
À sombra destas mangueiras
O verão:
Sou o verão ardente:
Que, vivo e resplendente,
Acaba de nascer;
Nas matas abrasadas,
O fogo das queimadas
Começa a se acender.
Tudo de luz se cobre...
Dou alegria ao pobre;
Na roça a plantação
Expande-se, viceja,
Com a vinda benfazeja
Do próvido verão.
Sou o verão fecundo!
Nasce no céu profundo
Mais rutilo o arrebol...
A vida se levanta...
A natureza canta...
Sou a estação do sol!
Coro das quatro estações:
Que calor, irmãs! Cantemos
Como ardem as ribanceiras
Cantemos, irmãs, dancemos,
À sombra destas mangueiras.
O outono:
Sou a sazão mais rica:
A árvore frutifica
Durante esta estação;
No tempo da colheita,
A gente satisfeita
Saúda a criação,
Concede a natureza
O prêmio da riqueza
Ao bom trabalhador,
E enche, contente e ufana,
De júbilo a choupana
De cada lavrador,
Vede como do galho,
Molhado inda de orvalho,
Maduro o fruto cai...
Interrompendo as danças,
Aproveitai, crianças!
Os frutos apanhai!
Coro das quatro estações:
Há tantos frutos nos ramos,
De tantas formas e cores!
Irmãs! Enquanto dançamos,
Saíram frutos das flores!
***
“Da escuridão a luz, da luz a escuridão”, é um verso encontrado em muitos poemas e preces de origem e inspiração celta. Essas palavras referem-se a crença druídica de que da noite nasce o dia, do inverno nasce a primavera, e da morte nasce a vida. Para os celtas o dia começava com o pôr-do-sol, o ciclo anual começava no fim do verão, ou seja, em Samhain (novembro), e os meses, segundo o Calendário de Coligny, começam com a lua nova e têm na lua cheia o seu meio ou ápice.
Ao longo do ano druidas/druidesas e politeístas celtas celebram geralmente oito festivais. Os quatro a seguir são considerados os “grandes festivais” e foram largamente celebrados pelos antigos povos celtas:
Oíche Shamhna/Samhain (entre 30 de outubro e 2 de novembro): festival que marca o fim do verão, representa o fim e início do Ciclo e homenageia os antepassados.
Lá Fhaile Bríde/Oímealg (1 ou 2 de fevereiro): o primeiro sopro ou primeiro indício da primavera, festival de purificação e fertilidade.
Lá Bealtaine/Bealtaine (30 de abril - 1 de maio): o início do verão, ritos de fertilidade, cura e prosperidade.
Lá Fhaile Lœnasa/Lughnasadh (1 ou 2 de agosto): festival da colheita, início do outono, celebra-se a fartura da natureza e reforça-se os laços entre a Tribo e a Terra.
Além desses festivais comumente celebram-se os Solstícios de Verão (21 de junho) e Inverno (21 de dezembro), e Equinócios de Primavera (21 de março) e Outono (21 de setembro), momentos que marcam as estações e as transformações do clima e da natureza como um todo.
Alguns grupos e indivíduos acrescentam festivais ou devoções a deidades individuais ou de acordo com o clima local, como um fenômeno natural do local que tenha significado para eles. No Pacifico noroeste, por exemplo, reconstrucionistas celtas celebram um festival anual na época dos salmões. Há alguns grupos de Gales e França, que celebram um festival para Épona no mês de dezembro, e na Ilha de Man muitos pagam tributos (oferecem junco, maçã e outros sacrifícios) à Manannan por volta do solstício de verão.
De maneira geral, as estações são marcadas por mudanças do clima e da paisagem local e não da estrita observação de datas no calendário. Apesar de nos guiarmos por datas, não nos fixamos nelas, pois os ciclos da natureza não se fixam. Alguns druidistas, baseando-se no Calendário de Coligny, celebram os festivais na lua cheia mais próxima da data, e dessa forma guiam-se pelo ciclo lunar, que é mais natural do que seguir datas no calendário civil.
Os festivais sagrados são marcados não só por aspectos temporais, climáticos, relacionados aos ciclos da Natureza, mas também por aspectos míticos, simbólicos, atemporais, relacionados aos ciclos de nossa vida, seja no âmbito interior ou exterior, emocional ou físico, espiritual ou material.
Assim como a natureza vive as estações, nós também vivemos as nossas estações. Vivemos a Primavera quando somos (e nos sentimos) jovens e pulsamos energia e entusiasmo; vivemos o Verão quando estamos plenos de vitalidade, paixão e fertilidade; o Outono, quando colhemos os frutos de nossas ações e nos sentimos gratos pela generosidade do universo; e o Inverno, quando acumulamos sabedoria diante das inúmeras experiências vividas e recolhemos nossas energias dentro de nós mesmos para, enfim, devolvê-las a Terra...
Ao celebrarmos os festivais sagrados a intenção deve ser honrar os Deuses e ancestrais, fortalecendo os laços entre eles e nós, e sintonizar ou alinhar os ciclos da natureza com os ciclos de nossa vida. As dádivas provindas disso, dentre muitas, são a cura (nossa e da Terra), a sabedoria diante dos mistérios da Vida, e a compreensão serena diante das mudanças que tanto a natureza quanto nós passamos.
* Texto utilizado na roda de conversa sobre Druidismo, realizada em 16/06/12.
Foto: Nemeton Samaúma na roda de conversa sobre Druidismo, em 16/06/12, no Bosque Rodrigues Alves (Belém-PA).